Pular para o conteúdo principal

Educação com saúde: os professores não irão trabalhar colocando vidas em risco


Nas últimas semanas, muitas pessoas comuns e até mesmo veículos de mídia têm afirmado que os professores não querem retornar as aulas presenciais porque o ensino remoto permite que eles recebam seus salários sem trabalhar. Essa visão, ancorada na desinformação e no preconceito, é completamente equivocada, uma vez que ignora algumas questões básicas. 

Em primeiro lugar, o ensino remoto não é sinônimo de menos trabalho para os professores. Pelo contrário, desde que começou a pandemia do Coronavírus os professores precisaram se adaptar a essa nova realidade, sendo que o trabalho deles aumentou sensivelmente. Agora, mesmo estando em casa, eles precisam organizar planos de aula e atividades específicas para o contexto de ensino virtual. Além disso, muitos deles precisaram comprar materiais de informática e aumentar a velocidade de suas internets residenciais para conseguir dar conta das demandas geradas pelas aulas online. Somado a isso, vemos que muitos professores ampliaram suas jornadas de trabalho, uma vez que as reuniões pedagógicas e as mensagens dos alunos para tirar dúvidas se tornaram muito mais frequentes. 

Em segundo lugar, é necessário ressaltar que os professores desejam sim o retorno das aulas presenciais, pois sabem que o ensino remoto é muito deficiente e exclui boa parte do alunado que não tem acesso as tecnologias da informação. Entretanto, também sabem que atualmente nosso país ainda não controlou totalmente a pandemia do Coronavírus, tampouco forneceu equipamentos de higiene e protocolos de biossegurança adequados para que as aulas retornem presencialmente sem colocar a vida das pessoas em risco. Diante desse cenário, o retorno prematuro das aulas poderia gerar uma nova onda de contaminações e potencialmente causar a morte de milhares de pessoas. Isso porque, mesmo as crianças e jovens não pertencendo ao grupo de risco, eles podem transmitir a doença ainda que estando assintomáticos. 

Por fim, em última análise, cumpre destacar que, apesar de ser repercutida pelos meios de comunicação de massa, essa falsa percepção de que os professores não estão trabalhando durante a pandemia foi inicialmente elaborada pelo próprio presidente da república. Nesse sentido, causa espécie observar que, o indivíduo irresponsável que não combateu a doença de maneira eficaz, é o mesmo que agora critica aqueles não estão dispostos a colocar suas vidas em risco no caos produzido por ele. Diante desse contexto absurdo, portanto, é preciso que os professores digam em alto e bom som: não existe educação sem saúde, não iremos retornar as aulas presenciais sem ter a certeza de que nenhuma vida será colocada em risco.

Comentários

  1. Parabéns! Excelente reflexão. Muito bem fundamentada sua discussão. Concordo com você, a volta às aulas presenciais exige responsabilidade e segurança. No Brasil, o professor precisa ser mais valorizado. É preciso desconstruir esse discurso de que o professor não quer trabalhar. Aliás, a quem interessa esse discurso mentiroso que desconstrói a imagem do professor? Somente ao atual governo que desrespeita o professor e desvaloriza a educação, a ciência e a cultura.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Let the old dreams die: o conto de John Ajvide Lindqvist

Lindqvist é um autor sueco que se tornou bastante conhecido com a publicação da novela Let the right one in (Deixa ela entrar). A história trata da vida de um garoto solitário e vítima de bullying chamado Oskar. Ele vive na antiga Blackeberg (Suécia) e estabele uma relação de amizade (ou seria amor?) com Eli, sua nova vizinha.  Eli é uma vampira e, portanto, precisa de sangue para sobreviver. Ao poucos as duas crianças travam uma forte relação e passam a ajudar um ao outro. O livro de Lindqvist foi publicado no Brasil pela Editora Globo e também ganhou uma adaptação para o cinema muito bem produzida por Tomas Alfredson. Esse filme contou com as atuações exuberantes dos atores suecos Kare Hedebrant e Lina Leandersson. Depois de todo o sucesso e reconhecimento mundial, Lindqvist escreveu um conto que soluciona a ambiguidade final do livro. Em Deixa ela entrar , Oskar e Eli fogem no final após o massacre da piscina. Lindqvist escreveu o conto Let the old dreams die (Deixe ...

Beach rats: a verdade é despretensiosa

O filme Beach rats (Ratos de praia, 2017) começa com o jovem Frankie (Harris Dickinson) se fotografando no espelho, ainda envergonhado conversando com homens mais velhos pela internet, ele se encoraja e finalmente pede para ver um deles nu. Depois, vêm os fogos de artifício. Uma garota, que será sua futura namorada, olha para ele e comenta o quanto aquele brilho no céu é romântico. Frankie discorda e a moça então questiona: “qual é sua ideia de romance?”. Ele se silencia. Os fogos serão uma importante metáfora imagética ao longo do filme, sendo retrados também na tela do computador do rapaz. Na última cena do filme Frankie retorna para esse mesmo cenário, promovendo a percepção de que o questionamento feito a ele ainda permanece sem resposta. Ele ainda busca entender seus desejos sexuais. Os fogos de artifício servem para metaforizar a adolescência e juventude, mas fora da percepção típica do senso comum. Para além de uma época em que os desejos estão à flor da pele e em que se...

The Dreamers: o destino de Matthew no romance de Gilbert Adair

Entre os filmes que marcaram minha adolescência e juventude, The Dreamers (Os sonhadores, 2003) de Bernardo Bertolucci está na minha trilogia de favoritos, juntamente com Deixa ela entrar e O leitor . O filme conta a trajetória dos gêmios Théo e Isabelle e a forte relação estabelecida entre eles e o estudante estadunidense Matthew. Tudo ocorre após a cinemateca parisiense que frequentavam ser fechada. Com os pais ausentes, os irmãos e seu novo amigo trancam-se dentro de casa e, enquanto participam de um caprichoso jogo cinéfilo e sexual, permanecem completamente indiferentes a toda a agitação social que se produzia na França de 1968. Acordados com uma pedra que invade o grande apartamento, os jovens finalmente saem pra a rua e descobrem assustados tudo que estava ocorrendo. No filme, vemos ao final o casal de gêmios se separando de Matthew em meio à confusão, pois o jovem estrangeiro não deseja participar dos atos de violência. Esse enredo cinematográfico de The Dreamers é bas...